Cultura Surda
Cláudia A. Bisol e Carla B. Valentini
A cultura surda diz respeito ao conjunto de práticas, crenças, valores, tradições, língua e modos de comunicação compartilhados pelas pessoas surdas. Este conceito vai além da simples condição de surdez e compreende as experiências e identidades únicas das pessoas surdas, ou seja, trata-se de um processo de significação construído no contexto cotidiano dos surdos.
A cultura surda é visual, com singularidades e formas específicas de organizar o pensamento e a linguagem. Literatura, teatro, poesia, música e artes visuais refletem experiências e emoções dos surdos, constituindo um patrimônio que registra a riqueza cultural desta comunidade. A base desta riqueza cultural está nas línguas de sinais. No Brasil, a Libras – uma língua rica, compartilhada, sempre em evolução, e uma comunidade que se reconhece enquanto um coletivo capaz de sustentar as singularidades, com seus líderes e sua história.
O termo cultura surda, portanto, descreve as crenças, comportamentos, entretenimento, tradições literárias, arte, história, valores e instituições compartilhadas por aqueles que utilizam a língua de sinais como sua forma de comunicação.
Vamos tomar como exemplo a poesia. Um encontro com a poesia pode provocar ideias e emoções profundas ao explorar temas universais, como amor, perda e identidade. Para Quadros e Sutton-Spence (2006), a poesia em língua de sinais usa uma forma intensificada de linguagem para efeito estético (sinal arte), assim como faz uso da linguagem em primeiro plano, diferente da linguagem cotidiana, o que permite trazer consigo um significado adicional e criar diversas interpretações do poema.
Convidamos você a se deixar afetar por uma poesia em Libras. Não se preocupe em identificar os sinais, busque mergulhar nas expressões e na linguagem em sentido amplo. É uma poesia acerca do cotidiano, da vida, da família, de lembranças…
A cultura surda é uma cultura minoritária, como tantas outras, que sustenta espaços específicos para os membros de sua comunidade e quem de perto convive. Ao mesmo tempo, uma cultura que mantém pontos de tensão, de contraposição ao olhar dos ouvintes. Referências culturais permitem que os surdos se considerem sujeitos culturais e não deficientes (Perlin, 2004).
Como em todas as culturas, é na coletividade que as identidades surdas se constituem, lutando por sua cultura minoritária e para ocuparem o lugar de protagonistas de suas histórias. A Feneis é um exemplo da importância dos espaços coletivos. A Federação Nacional de Educação e Integração dos Surdos (Feneis) é uma entidade filantrópica para defesa dos direitos da Comunidade Surda Brasileira, filiada à Federação Mundial dos Surdos, situada na Finlândia (feneis.org.br).
Cultura surda: entre o coletivo e a singularidade, a criação abre espaço para inscrições de sentido que circunscrevem identidades, modos de ser e de sentir, modos de estar no mundo.
Bibliografia
Perlin, G. T. (2004). O lugar da cultura surda. Em A. S. Thoma & M. C. Lopes (Orgs.), A invenção da surdez: cultura, alteridade, identidade e diferença no campo da educação (pp. 73-82). Santa Cruz do Sul: Edunisc.
Quadros, R. M. de; Sutton-Spence, R. Poesia em língua de sinais: traços da identidade surda. In: QUADROS, R. M. de. (Org). Estudos Surdos I. Petrópolis, RJ: Arara Azul, 2006.
Skliar, Carlos (org.). A Surdez: um olhar sobre as diferenças. Porto Alegre/RS: Mediação, 1998, p. 7 –32.
Para citar este texto
Bisol, C. A. & Valentini, C. B. Cultura Surda. Projeto Incluir – UCS/FAPERGS, 2011. Revisado e atualizado em 2024. Disponível em: <https://proincluir.org/surdez/cultura-surda/12-11-2024